terça-feira, janeiro 03, 2006

Vazio


O som de vozes povoava a sala. Havia fumo vindo de mesas ao fundo. Ele olhava o prato vazio com alguns grãos de arroz que haviam sobrevivido à sua refeição. Ela ainda comia avidamente e o silêncio continuava disposto sobre a mesa. O desinteresse nas palavras era comum aos dois lados e o almoço deixara à muito de ser social para ser apenas umas horas a preencher na semana incolor. As vidas já não eram lançadas sobre a refeição por ambos saberem que tudo acabaria em discussão. Rendiam-se então à apatia e olhavam o ambiente para evitarem o olhar. Ela saboreava o último cogumelo enquanto ele olhava distraído a televisão. Ela tentava olhar para ele com o a ternura e carinho de outros tempos. Era seu filho, fruto do seu ventre. Mas havia crescido para fora dele e para fora da sua vida. Ao abandonar a sua casa ele deixou para trás o cuidado constante e a preocupação com cada passo desde que começara a andar. A culpa era dela certamente. Foi ela quem o ensinou a andar, a correr. Ainda se preocupavam um com o outro certamente. Mas era um sentimento desprovido de toda a afectividade. Quando era mais novo era ele quem a procurava, Lembrava-se de quando ele se agarrava às suas pernas quando ela saía de casa para trabalhar. Agora já nem lhe tocava a mão. O amargo de anos de secura instalara-se e contamindado irremediavelmente a sua relação com ela. Ela olhando-o recriminava-se agora por ser uma mãe ausente, procurando o dinheiro e deixando o bem mais precioso que tinha para trás. Ele olhava agora as suas mãos, e num reflexo escondeu-as por não estarem a gosto dela. A severidade dela marcou irremediavelmente a relação com a sua mãe.A sua ausência nunca fora um problema mas sim a severidade. A ausência era bem-vinda porque significava liberdade. Só na solidão ele era livre para fazer o que queria sem reprimendas a todo o instante. Começou então a desejar a ausência da sua mãe e a aversão à sua presença e a partir daí nunca mais viveram juntos. A mudança de casa só implicou uma mudança física. Ambos pediram café e tomaram-no sentenciando a o fim do pesado almoço. Levantaram-se ainda sem se olhar e sairam. Chegados à porta ele sentiu a impossibilidade do silêncio e perguntou-lhe onde estava o seu carro. Então sentiu o olhar dele sobre ele e por ser isso tão estranho olhou-a imediatamente. Duas lágrimas sujavam-lhe a face. Ela olhava-o enquanto via a sua cara explodir em surpresa. «Estou doente» esclareceu ela para lhe afastar a surpresa. Mas a sua face continuou em choque e ela para evitar sentimentalismos fez um gesto para se despedir. Mas ele encontrando o que havia à muito perdido no seu peito, abraçou-a e segredou-lhe ao ouvido que ela iria ficar boa. E no abraço voaram juntos para a vida.De novo.

2 Comentários:

Blogger styska disse...

Já to disse, gosto mto desta ideia... Quando se fala em amor toda a gente pensa no mesmo, tanto que acho que já se tornou em algo banal (infelizmente)... Mas há tantas formas de amar e qs nunca ninguém se lembra delas! Esta é para mim uma das mais belas e o texto tá mto bonito. Diferente, sim, mas pq o amor é smp diferente e n é por isso q é pior ou melhor... é simplesmente diferente! E eu gostei!
beijinho*

4:22 da tarde  
Blogger Psyreg disse...

Amei*

11:01 da tarde  

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