quarta-feira, janeiro 21, 2009

Conta-me o Natal

De entre os pregões alguém acelerou um garoto em direcção ao Natal. Outros dois mais crescidos abanavam as pernas para aquecerem os pés e arrefecerem o nervosismo. Ele já não sabia bem o que lhe dizer. Um só receio ocupava a sua mente.
-A tua mãe demora muito? - perguntou ela voltando à impertinencia enquanto fazia parar as pernas dele.
-Eu não sei se ela te vai dar azevinho...-disse ele tentando afastar a ideia da sua mãe chegar. Estava bem ao lado dela agora.-Moras muito longe?
-Eu moro mais ao menos, mas a minha avó mora aqui perto. E tu?
-Também mais ao menos.- A voz dele parecia aquecer-se de vergonha e esfumaçar-se à saida da boca. A beleza dele parecia tomar-lhe o peito e toda a cabeça no quente do verão.
-Está um bocado de frio. Achas que podia nevar?- Sara não procurava desconversar como os crescidos quando falam do tempo, tentava sim encontrar interesses em comum com a pequena companhia que lhe tinha arrebatado da sua insolencia.
-Eu gostava muito.-respondeu ele ainda tomado com toda a vergonha.
-A minha avó diz que não neva. Antigamente era tudo diferente, que agora já não neva. Não acho isso muito justo sabes? Nós também temos direito. Alguma vez viste neve?
-Sim, uma vez fui à serra da Estrela tinha neve lá.
-Eu nunca vi e queria muito.
O sol brilhava intensamente num sol demasiado vazio para os sonhos de Sara. As pessoas na rua acotovelavam-se e corriam, confirmando que o Natal estava perto. Se pudessem pediam à Maria que aguentasse mais um bocadinho, que não podia ser já, que ainda faltavam muitas prendas no pinheiro. O David dizia o mesmo. Ainda não podia vir já a sua mãe. Ele que passara as últimas semanas a desejar o chocolate do dia seguinte, hoje só queria que o Natal esperasse um bocadinho.
-No sitio onde moras não neva? - perguntou ele tentando afastar o tempo.
-Quem me dera! Nunca nevou. Se nevasse lá nevava aqui. Não é muito alto na minha casa.
-Na minha também não- disse ele muito rápido esperando morar perto dela.
-É por isso que não neva...
Os olhos dela percorriam agora o dourado dos cabelos dele, e sem que ela soubesse, o seu coração suspirava. Ele suspirava olhando o braço maior do palhaço que trazia no pulso que se mexia cada vez mais depressa.

*um atraso destes não se desculpa, mas afinal o Natal é quando duas crianças quiserem ;)

4 Comentários:

Blogger Gui disse...

Está perfeitamente explicado o atraso, então, coitadinho do David, que queria tanto que o Natal demorasse só mais um bocadinho. Eu estou com ele, sabes? Há coisas que de tão boas que são, não nos importamos de esperar por elas.
Nem que seja um ano inteiro, como espero sempre, com a ansiedade crescente,que contes o Natal.

(Li devagarinho, como quem saboreia o último quadradinho daquele chocolate tão bom, que sabemos só voltar a ter daqui a muito tempo.)

11:49 da manhã  
Blogger styska disse...

este acreditei mesmo que já não o via! foi uma surpresa agradável :)

9:36 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Belo Conto!...

Gosto muito de ter ler, continua p.f. a escrever para nossa maior felicidade.

Parabéns!

Mamy

5:17 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

"Ele que passara as últimas semanas a desejar o chocolate do dia seguinte, hoje só queria que o Natal esperasse um bocadinho."

Mas o Natal não esperou.. :( e eu nem pedi pa ele esperar mais um bocadinho...

Mas sabes o que atacou o meu coração quando li este texto?

(não por ser Natal mas por todo ele me transmitir uma sensação de tempo fugidio)

Aqueles passeios pelo Porto, aqueles almoços malucos na cantina, aquelas aulas onde eu estava em todo o lado menos lá, aqueles bilhetinhos patetas e palhaços em todas as folhas das sebentas! e.. e.. até nem me importo que me voltes a chamar fiteira!...

Gosto muito de TI... És um amigo que ficou bem, bem lá no fundo do coração e acho que poucos lá chegarão!



*'s

mikinha

10:04 da tarde  

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