quinta-feira, junho 05, 2008

O Chamamento das Sereias

Deixei-te, como sabes, com um beijo e um sorriso no 3º piso do antigo colégio de órfãos na praça Gomes Teixeira. O velho elevador mandou-me de volta à rua e à companhia dos velhos leões que por ora não espalhavam água na fonte. Abri o mundo imaginário no colo e aguardei o vento. Quando veio trouxe consigo o som do velho motor eléctrico que me correu nas costas. Fazendo de mim esquina veio parar pouco adiante do meu banco. Agarrei na trouxa volumosa e segui rumo a ele. Ainda hesitei por alguma vergonha de passear a minha leitura. Mas o guarda-freio convidou-me a entrar e acabei por me sentar à janela que abri prontamente. Os Clérigos passaram despercebidos à medida que me embrenhava mais na leitura. Só me subiu a cabeça quando o eléctrico estacou em plena Batalha. Subi por obrigação para me colocar junto da paragem esperando que o trólei fosse colocado na posição inversa. Mas, de súbito, a Muralha Fernandina pareceu demover-me de retornar à baixa na companhia do livro. Fiz-lhe a vontade e acompanhei-lhe o perfil na velocidade do Funicular dos Guindais. As vertigens que nunca tive permitiram-me deliciar-me com a queda lenta até ao rio. A ponte férrea olhou-me de todo o seu ar altivo apontando-me um carro que me deixou atravessar. De dentro o sorriso que surgiu fez tilintar o sino da felicidade e sorri de volta à minha madrinha. Ainda com o sorriso na face desci até ao Douro onde ele me acenou breves ondas contra as escadas. Acenei de volta e rumei junto do Cubo onde se colam as pombas e se espalham os turistas. Olhei com desdém o S. João e decidi voltar a encontrar-me com o eléctrico. Junto à Igreja de S. Francisco um papel na parede informou-me que não voltaria a ver por ora o meu companheiro de leitura. Carregado com os livros e a roupa que foi caindo com o calor caminhei junto ao rio. Este pintava-se de prata e preto pelo sol enquanto prematuras iluminações coloriam os passeios. Enquanto vislumbrava o nosso Porto estendido sobre a escarpa vi o Palácio da Justiça apontando-me o meu destino. Percebendo que se seguisse o rio o meu destino se afastava olhei de sobremaneira as escadas que se erguiam à minha direita. Depois de parar para hesitar o impulso sobrepôs-se ao receio e acabei por subi-las. 93 contei até que uma deserta viela me mostrou mais um patamar. Mas aí não as contei. A minha atenção espalhara-se numa só direcção. Duas sereias carregavam um palácio que parecia reluzir o meu sorriso.


*Lembro-me de um livro pequeno de capa verde que falava de cipestres no Porto. Lembro-me de duas sereias roubadas com um laser que cortava pedra como se fosse manteiga. Lembro-me da euforia de as descobrir numa noite em que andei perdida por ruas que não eram minhas. Lembro-me da tristeza de não as voltar a encontrar por mais que as procurasse. Lembro a felicidade quando mas devolveste!
Miluji tě

3 Comentários:

Blogger styska disse...

felicidade :)*

10:40 da tarde  
Blogger Gui disse...

A vontade que (me) dá é pegar neste texto e fazer dele roteiro para descobrir as sereias. E sabe bem ir reconhecendo lugares do nosso Porto à medida que percorremos estas linhas.

(agora dar-me um nó na cabeça é que não dona styskinha:P E que nó!)

9:34 da manhã  
Blogger Liliana Bárcia disse...

ah =D

que grande viagem!!

10:14 da tarde  

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