quarta-feira, março 30, 2005

Monólogo Apaixonado nº6

Distante. Separado de ti já há meses mas ainda permaneces em mim. Já não te vejo, nem as tuas costas nem o teu olhar. Não sinto a tua indiferença nem a tua atenção. Sinto só a tua falta. Não, não como um drogado a quem falta a droga. Não estou tão desesperado. Sinto a tua falta como quando alguem corta o cabelo e passa a mão pela cabeca o gesto habitual desvanece-se no ar sem vida. Mas toda esta distância faz-me bem. O espaço e tempo que nos separam fazem desvanecer a quase totalidade da tua divindade. Vou-me esqucendo que tu és uma deusa e que não me é permitido olhar para ti sem o proposito de te orar. Não me é permitido desejar-te, mas a separação apaga essa norma deixando livre o meu imaginário para te fazer minha.
E fiz-te. Sonhei contigo minha, e dançavamos no céu até não podermos mais. Eu sorria feliz e tu rias-te para mim iluminando a minha face. Mas não era feliz. Não mo permitias. Apesar de toda a distância e liberdade para sonhar era-me constantemente repetido que não passava de uma ilusão etérea. E eu sei-o.Não o temo. Por isso vivo assim, a minha cobardia não me permite esquecer que tudo não passa de um sonho. Tenho vontade de voar nas asas da ilusao mesmo sabendo que me despenharia metros à frente na escarpa da tua indiferença. Mas tu não me deixas, mantens-me aqui nesta cama para que vá morrendo lentamente sempre agarrado à vida com medo de deixar este mundo. Quem me dera não ter medo da morte. Mas tu não me deixas, não me deixas.

sexta-feira, março 18, 2005

Monólogo Apaixonado nº5

Estou feliz. Nada de enormemente grande, mas uma felicidade percorre-me o corpo por pequenas coisas. Nada de exageros mas alegria pura vai explodindo no motor do meu coração. Foi ateado por pequenas faíscas, mas agora arde intensamente e eu ondulo na alegria como uma chama. Estou embriagado de ti e do mundo. Por isso ardo tão facilmente, por isso esta alegria me consome agora.
Mas foste tu quem a ateou. Fizeste arder os destroços do que era meu numa pira tremenda e desmedida. Mas não me importo, pelo menos sou feliz.
Ali prostrado a teus pés admirando a imponência da toda a escultura do teu ser sinto-me pleno, sinto que ali devo estar, que o meu lugar é a teus pés. Para que se a minha presença te for incómoda me possas espezinhar eliminando o meu ser. Mas eis que tu desces do alto da tua grandeza e te pões a meu lado para que possa ver a tua face. E como a prefiro ver. Vendo-te a cara vejo-te a alma. Posso olhar a beleza que existe nas duas formas. E como te olho, olho-te incessantemente sem me cansar. Gasto-te o rosto em longas observações a cada detalhe da tua beleza. E de repente como uma benção divina ele vem.
Flutuando e serpenteando ele vem ao meu encontro paralisando-me imediatamente. Durante segundos que parecem horas só vejo os teus olhos a olharem-me de volta. Depois como um fusivel demasiado quente queima-se e a ligação quebra deixando de novo o intervalo entre nós.
Não tarda muito torna a vir. Quente, electrizante e consumidor vêm ao meu encontro e me faz explodir. Uma e outra vez mais. Tudo deixa de ter importância, o sitio onde estou, o que estou a fazer. Nada mais é cuidado, todos os movimentos soltos deixando a concentração desimpedida para esse teu olhar que vem. Tudo me é belo quando ele vem. Tudo é feliz e eu também o sou.

segunda-feira, março 14, 2005

Monólogo Apaixonado nº4

Odeio-me. Odeio-me por te ter odiado. Para que te disse eu aquelas coisas? Para que te pedi que não me olhasses? Pensava que suportava a tua frieza, que te esqueceria se tu não me olhasses. Mas não. Não aguento que me trates assim, que não me olhes mais. Sofro, caem-me lágrimas a ferver no coração já fragil de cada vez que me ignoras. Sempre pensei que fosses bela em todo o teu ser. Que cada pedaço do teu corpo fosse perfeito para constituir o teu ser angelical. Mas não. As tuas costas são horrendas. Não as suporto. Cada vez que as olho sobem-me vómitos de dor e quero-te expulsar do meu coração num espasmo nojento. Não aguento ver as tuas costas voltadas para mim como um sol que me queima. Peço-te olha-me. Não ligues ao que te disse. Não o sentia, não o quero, não o aguento. Perdoa a minha infantilidade, perdoa-me as palavras que te disse. Não as sinto nem as senti. Não mais quero ver as tuas costas., não me ignores mais.
Seja porque motivo for, olha-me! Nem que seja porque te faço lembrar o teu primo distante, nem que seja por ter algo ridiculo na cara. Nem que seja porque me odeias. Desde que me olhes.
Se não vou continuar a odiar-me, vou sentir a culpa de ter dito o que não quis. Sou culpado, é esse o meu veredicto. Mas já cumpri a minha pena. Tu sabes, tu foste o carrasco.Acaba com isto Não me ignores mais. É tudo que te peço. Não me ignores.

domingo, março 13, 2005

Monólogo Apaixonado nº3

Sento-me à espera que passe. Olho o infinito e espero que tu passes. Deitado tocando o azul do céu espero pacientemente que tu deixes o meu coração. Sim estás lá dentro. Mas não fiques convencida, não fui eu quem te pôs lá nem sou eu quem te mantêm. Não penses que te amo, que és tudo que sempre sonhei, que me poria em frente a uma bala por ti. Desengana-te. Só estás dentro do meu coração. Nada de especial. Então porque faço eu tanto alarido perguntas tu. A resposta só não é obvia para ti, que a enormidade do teu egocentrismo te cega a resposta. Não te amo, não estou apaixonado por ti. Nunca poderia ser. Dou-te atenção porque estás sozinha. Sozinha dentro do meu coração. Tens a exclusividade do meu sentimento. Não é que ele seja grandioso é apenas único. Sento-me à espera que passe. Amarro-me à inércia e deixo que o tempo me lave de ti. Não sou destas coisas. Não sou paciente, nem gosto de esperar. Sei-o porque me atormenta a inquietação e me impele a fazer algo estupido. Imagina! Eu chegar à tua presença e dizer-te que és a única no meu coração. Não tenho medo que me partas o coração. Não... Nem que explodisses lá dentro farias grande dano. Não tenho medo de tu me negares, de me afastares. Sabes de que tenho medo? Que olhes para mim e m vejas por dentro, que vejas a minha criança interior e que depois a vás espalhar aos sete ventos. Que a exponhas e a mostres a toda a gente. Por isso me acorrento e te espero esquecida. Nada farei a não ser olhar o sol vermelho da tua existência a pôr-se no mar do esquecimento.

sexta-feira, março 11, 2005

Monólogo Apaixonado nº2

Não me sais do olhar. Não é da memória porque não tenho. Apago-a a cada segundo. Expulso a tua imagem da minha cabeça porque me põe tonto.Não te quero pensar, não te quero recordar. Mas em cada corpo te vejo, em cada face te olho. Tudo és tu, e eu sou nada. És tudo que não posso querer és tudo que nunca terei mas nada em mim te quer olvidar. Procuro-te inconscientemente acabando por partilhar o mesmo tecto. Mas de nada me serve. Eu na minha infinita vergonha escondo-me de olhos fitos no chão, não te quero mais ver, não te quero mais desejar. Mas tu obrigas-me. Puxas o meu olhar exigindo a minha atenção. E obrigado te olho e tu devolves-me o olhar e regressas ao teu trono sem dizer uma palavra. Sem esboçar um sorriso. Porque me fazes isto? Porque me humilhas desta forma. Fazes-me desejar-te para que do alto da tua superioridade negares tudo o que desejo com o polegar apontado para baixo.
Eu desisto, regresso à minha amarga solidão mas os meus olhos queimados pela tua imagem já so te vêm. Como uma marca de sol a tua imagem enquadra-se em cada rosto e só passado pouco tempo se esbate e dá lugar à minha desilusão.
Porque me castigas tu? Desejo-te mas sei que não te posso ter. Se pelo menos deixasses de me torturar, se não mais me olhasses talvez eu te esquecesse. Não me olhes mais peço-te. Não me olhes

quinta-feira, março 03, 2005

Monólogo Apaixonado nº1

Frustrado. Um semana de antecipação, uma semana de preparação e quando tudo acontece nada se passa. Havia escolhido cuidadosamente a roupa, fiz brilhar cada pedaço do meu corpo para que o teu reflexo te sorrisse. Tremi na iminência de te ver.
E vi-te, vi-te e foste tudo. O mundo esbatido à tua volta como um halo da tua divindade. A felicidade cresceu dentro de mim. Explodi de alegria e ouvia violinos à minha volta num crescendo sem fim. Tudo era belo. Tudo eras tu.
Na iniquidade da minha felicidade esqueço-me de tudo o que queria fazer. Das palavras que pratiquei dizer-te, das caretas que te queria sorrir, das carícias que queria afagar. Esqueço até um olá, um bom dia, um sorriso de reconhecimento.
Vejo um filme, daqueles filmes tão idílicos que ninguém os acredita. Vejo-o e num momento de desatenção, enquanto um outro espectador se ri sonoramente e eu olho, tu desapareces, o filme acaba. Nem o genérico vi. Tudo tão rápido que nem dou conta que aconteceu.
Então tudo que de bom se tinha alojado em mim escorre-se deixando o gosto amargo da tristeza a latejar nas pontas dos meus dedos. Como se pela ousadia de querer tocar-te me fossem amputados os dedos para que nunca mais o fizesse.
Assustado com a minha dor fecho-me na sala escura e abro um pequeno buraco para tu me falares. Mas tu não falas. Clamo por ti com toda a força dos meus pulmões. Mas tu nada fazes. Nada fizeste quando o filme acabou. Não me avisaste que ia acabar. Nada, nem um sinal. Como se eu fosse realmente um espectador e tu por trás da tela não me visses. Como se cada vez que me olhavas não me olhasses na realidade mas sim a câmara fria.
Continuo no escuro esperando uma palavra tua mas tu vais esquartejando o meu coração com o teu silêncio. Só te peço uma palavra. É tudo o que te peço. Se eu já não te responder é porque já não vivo.