sexta-feira, abril 18, 2008

Lembro-me de ti(a)

Lembro-me primeiro de me doerem as unhas e de pizza ao jantar. Da Laika, do vento e das galinhas do lado. Lembro-me das cadeiras de verga e lembro-me de ser tão perto. Lembro-me de te mudares para alto, bem alto, e de querer mudar-me também para tudo ficar bem. Dos cereais misturados em latas de azeite a cairem na manhã tardia no nosso feliz leite. Lembro-me de ser metralha, zulu e sei mais o quê. De ser vitima de E.T.I. sem saber o negro que era. Lembro-me tão bem de um gravador a tocar num palanque, contando histórias antigas, que por não serem tuas as estudavas. Lembro-me de sleep-over's, slumberparty's e smarties. Lembro-me de uma gata, um gato, o meu gato e outro gato. Lembro-me de ti com um sorriso, sempre com um sorriso, mesmo se a vida to negava. Lembro-me do carinho e pedagogia com que sempre me afagaste, e ainda que não me lembre já do cheiro, lembro-me de me contares que sempre mo trouxeste para que ficasse marcado no coração. Lembro-te sempre. Lembro-te sempre no meu peito.

A Princesa Andorinha

Houve num tempo uma princesa chamada Ana Andorinha. Tinha as asas negras e o peito branco e gostava de voar por todo o lado. A princesa era filha dos grandes Reis Rolas. Viviam todos felizes no Palaninho desde que a pequena Ana se podia lembrar. Ana gostava muito do Palaninho. Era um grande ninho feito de pauzinhos e argila recolhidos por passarinhos de todo o reino. As paredes exteriores estavam enfeitadas com penas de mil cores e na torre mais alta do Palaninho estendia-se a pena de pavão que se via por todo o lado.
Houve um dia em que o vento soprava mansinho e Ana pediu ao seu pai para voar até ao Pomar dos Passarinhos.
- Podes voar mas não te esqueças de descansar e vem para casa antes que se levante o vento do pôr-do-sol.
A Ana prometeu que sim e voou contente pela manha fora.
-Ah, como sabe bem voar! - disse Ana ao sentir o vento deslizar por baixo das asas fazendo-a planar. Voou feliz durante campos e campos. Viu outros passarinhos e disse-lhes olá e bom dia com muita alegria. Gostava tanto de voar. Viu ratinhos a passear no campo e disse-lhes adeus lá de cima. Eles respondiam contentes e a Ana dava piruetas para os ver sorrir.
Quando a pena de Pavão já não se via ao longe, e ar era mais quente e fácil de voar Ana viu as primeiras macieiras com as suas maças vermelhinhas a brilharem ao sol. Que feliz que Ana se sentiu! Parecia Natal de novo e voou com tanta força para o Pomar como corria para as prendas no natal.
Estava tão cheia de sede de voar tanto que mal aterrou no ramo deu uma bicada na primeira maçã vermelhinha que viu. Era tão doce e fresquinha. Estava mesmo feliz. Continuou a beber da maçã que o sol ainda não tinha aquecido. Quando ficou satisfeita sentou-se no ramo a sentir a brisa, e ficou a olhar para o grande pomar dos passarinhos. Foi então que viu um passarinho castanho voar de um galho para o outro. Ficou a observar o que ele fazia muito curiosa. A Ana era muito curiosa.
Ele voava para junto de uma maça e em vez de a bicar batia-lhe com a asa e voava para outra, onde batia outra vez na mação com a asa. Dois toques e voava. A Ana estava muito intrigada.
Até que o passarinho voou para junto dela e ela sem vergonha nenhuma e cheia de curiosidade perguntou:
-Que estás a fazer às maçãs? - a cara dela estava cheia de curiosidade. O passarinho voou, deu uma volta à Ana e pousou no mesmo galho. Ana assustou-se com medo que ele lhe fosse bater como batia às maçãs. E ele de imediato estende a mão e Ana protegeu-se entre as asas dela. Depois ouviu um riso, e espreitando por entre as penas viu que o passarinho estranho lhe estendia a mão para a cumprimentar.
- O meu nome é Pedro Pardal. Prazer em conhecer-te,,, qual é o teu nome?
-Ana Andorinha - respondeu ela sem pensar bem no estava a fazer. Com o coração ainda aos pulos por causa do susto e ao mesmo tempo as penas arrepiadas porque este pardal era mesmo simpático.
-Sê bem-vinda ao pomar Ana. Eu acho que és nova por aqui não é? - Ana acenou com a cabeça - O que eu estava a fazer não era bem às maçãs, era às lagartas.
-Mas aquilo são maçãs, não são lagartas - Respondeu a Ana com alguma insolência.
E então o Pedro Pardal explicou à Ana que as lagartas viviam dentro das maçãs e que eram muito boas e saborosas.
-Blhec!- disse a Ana com a ideia de alguém comer lagartas. - Se tens aqui tantas maçãs porque é que comes lagartas?
-Pela mesma razão que tu comes maçãs quando há aqui tantas folhas! - respondeu o pequeno pardal fazendo os dois rirem-se muito.
E assim começou a risota de um dia passado a rir, a voar, a rebolar na relva, a chapinhar no lago, e a comer maçãs. Depois o sol começou a ficar vermelho e os dois passarinhos despediram-se com a promessa de no dia a seguir se encontrarem de novo para brincarem.
A Ana voava para casa feliz por ter feito um novo amigo. O sol ainda lhe aquecia a barriga mas estava a começar a esconder-se por trás do pomar. Ela voava de olhos fechados , a sentir o vento passar-lhe pelas penas. Até que se sentiu ir contra algo. Caiu. Tentou voar mas não conseguia. Abriu os olhos mas via tudo escuro. Estava tudo tão escuro e agitado. Até que com o medo Ana desmaiou.

O Pedro acordou com os primeiros raios da manhã. Saltou do ninho e pôs-se logo a assobiar de contente. Deu umas quantas piruetas no ar, voou junto è relva e bem alto no céu, e depois voou na direcção do pomar. Pelo caminho viu muitos passarinhos pendurados nos fios a conversarem preocupados, mas estava tão entusiasmado que nem parou para perguntar o que se passava. Chegou ao pomar e como ainda era cedo começou a procurar algumas maças que fossem muito boas. Marcou-as com o bico para depois ir comer com a sua nova amiga. Sentou-se depois no ramo e esperou que a Ana viesse. Esperou até o sol estar lá no cimo e ela não veio. Começou a ficar triste, e preocupado com a ausência da sua nova amiga. Começou a pensar que ela não queria mais brincar com ele. Ou que não tinha gostado de brincar. Estava tão triste. Até que começou a ver vir na direcção do pomar um pássaro ao fundo. Aproximava-se a uma velocidade grande. E depois olhou melhor e viu que eram mais. "Será que ela traz mais amigos?" pensou o pequeno pardal com o peito a encher-se de esperança outra vez.
O bando foi-se aproximando, até o Pedro perceber que era um Esquadrão de Estorninhos. Ficou intrigado por vê-los por aqui, mas ficou mesmo assustado quando eles pousaram na macieira onde ele estava. O estorninho maior pousou mesmo junto dele.
- O passarinho Pardal conhece a Princesa do Reino?
- Eu não. - respondeu o Pedro
-E viu uma Andorinha por estes lados ultimamente.
- Só a Ana, mas ela não é nenhuma princesa.
- O passarinho viu a Princesa Ana Andorinha? disse o Estorninho de forma autoritária.
-Não, sim. Eu não sabia que ela era a Princesa - respondeu o Pedro confuso.
- Mas teve contacto com ela?
-Tive. Ontem estivemos a brincar aqui no pomar todo o dia e depois ela foi para casa e prometeu que voltava hoje. E não voltou - disse o pequeno Pardal tão assustado como triste.
-Onde estava o sol quando ela partiu? - perguntou o guarda de peito inchado.
-Ali. - apontou o Pedro.
-Obrigado - disse o Estorninho - Esquadrão, voar na direcção do vento, comigo.
-Espere! e a Ana?
-Está desaparecida. - e dito isto o Esquadrão levantou voo na direcção de onde veio.
-Espere! Eu quero ajudar! - gritou o Pedro, mas ninguém o ouviu.
Mas o Pedro não era Pardal só de nome. Saltitou no ramo até à maçã mais próxima, comeu e voou atrás do esquadrão. Voava mais baixo do que eles e procurava no chão algo diferente. Ele conhecia aquele campo como a palma da sua asa. Foi voando até que viu uma pequena pena negra no chão. Pousou e agarrou na pena. "Pobre Ana" pensou ele "Foi raptada pelos Gatos Gatunos". Correu o chão e encontrou algumas pegadas na direcção do sol do meio-dia. Foi saltitando e viu um ratinho à procura de comida. Viu-o e foi logo falar com ele.
-Rato Ricardo! Viste os Gato Gatunos?
-Olá Pedro, por acaso vi! Ontem à noite estava na minha toca a pentear os bigodes e ouvi eles a passarem todos contentes e a fazerem muito barulho. Eu encolhi-me muito com medo. - respondeu o Ricardo um bocado assustado.
-E para onde é que eles foram? - perguntou o Pedro
-Foram na direcção do velho celeiro! Tu vais atrás deles? É muito perigoso!
Mas o Pedro já não ouviu o final do que o Rato disse. Voou com toda a força em direcção ao celeiro. Os gatos eram muito preguiçosos e o Pedro queria chegar lá enquanto eles dormiam.
O grande celeiro vermelho começou a aparecer no horizonte. O Pedro voava sobre grandes campos cheios de trigo, e a barriga dele dava voltas. Não porque tivesse fome, mas o medo parecia andar às voltinhas na barriga. Bateu as asas com força para chegar mais depressa. Tinha medo mas ao mesmo tempo queria ver a sua amiga. Estava ansioso. Quando o celeiro já era muito grande o Pedro voou na direcção do telhado.

Entrou por uma frincha no telhado. Cheirava a palha e o sol só entrava por pequenos raios que atravessavam a parede de madeira. Foi andando devagar sem as patas fazerem barulho através de uma grande tábua que unia o telhado. Quando chegou a meio parou e deitou-se na tábua a espreitar cá para baixo. Viu dois gatos, um vermelho e um malhado. Estavam deitados a dormir no feno mas pareciam poder despertar a qualquer momento. Correu os olhos pelo escuro mas não conseguia ver a Ana. Então o Pedro decidiu voar para mais perto do chão. Viu encostada à parede uma forquilha e logo voou para o topo do seu cabo. Os gatos não se mexeram, mas podiam estar alerta. Mas como ainda era alto o cabo, eles não chegavam ao Pedro. Foi então que viu uma coisa preta que se mexia mesmo entre os dois gatos. Era a Ana! Parecia estar amarrada para não voar. Ele tinha que fazer alguma coisa. Tentou magicar alguma coisa na sua cabeça de pardal. Com toda a força que tinha empurrou o cabo da forquilha para que caísse. E antes que ele tocasse no chão voou para o lado oposto do celeiro. O cabo caiu com grande estrondo ainda um pouco afastado dos dois gatos que num salto se puseram de pé e correram para junto do barulho.
-Que é que foi isto Gualter? - perguntou o vermelho
-O barulho veio daqui, Guilherme - respondeu o malhado.
Enquanto isto e voando o mais depressa que conseguia foi ter com a Ana e agarrando nas cordas tentou rompê-las com o bico.
A Ana ao ver o seu amigo ali tão perto não conseguiu deixar de exclamar:
-Pedro!
-Ali! - gritou o Gato Gualter
-Agarra-te as minhas patas - disse o Pedro à Ana. Ela agarrou e ele tentou com força voar na direcção do telhado. Os gatos saltaram e quase os apanharam com as suas unhas afiadas, mas o Pedro conseguiu com muito esforço bater as suas asas e chegar com a Ana à tábua do telhado. Enquanto ele lhe tirava as cordas ouviu os gatos em baixo.
-Por aqui Guilherme, acho que conseguimos subir por aqui.
-Consegues voar? - perguntou o Pedro à Ana
-Estive muito tempo amarrada, não sei mas acho que sim.
-Então vamos por ali. E o Pedro puxou a Ana de volta pelo buraco onde tinha entrado. Começaram a ouvir barulhos mais em cima.
-Vamos! - gritou o Pedro à sua amiga enquanto saíam pelo buraco. - Vai tu primeiro!
Ela foi à frente e o Pedro viu os gatos nas tábuas do telhado já . Ele saltou atrás mas quando olho para a frente não a viu no céu.
-Ana! - gritou o pequeno Pardal
-Aqui em baixa! - disse a Ana do chão junto ao celeiro. Então o Pedro desceu e ajudou a apoiar a sua amiga.
-Anda, vamos que eles não apanham.
Correram os dois, a Ana apoiada no Pedro em direcção à seara. Estavam quase a entrar na seara quando ouviram a porta do celeiro abrir com um grande estrondo. Correram para dentro da seara com esperança de lá se esconderem. O barulho parecia vir atrás deles. Eles corriam para longe do celeiro. Até que à frente deles viram um gato castanho. Sem tirar os olhos dos dois pequenos passarinhos o Gato miou tão alto que ambos tiveram que tapar os ouvidos com as asas. Os outros vieram na direcção dele e não tardaram em aparecer, um de cada lado. Estavam cercados. No meio da seara de trigo, cercados por todos os lados pelos Gatos Gatunos. Ana estendeu as suas frágeis asas à volta do Pedro com medo. Pedro não conseguia voar com os dois por mais que uns metros. Não podia fazer nada. E do nada um chilrear gritava:
-Atacaaar!!
Era o Esquadrão de Estorninhos! Tinham-se dividido em 4 grupos, Enquanto cada grupo atacava um gato com bicadas, o quarto grupo pegou nos dois passarinhos içando-os no ar, voando para longe do celeiro. Os outros juntaram-se a eles e só pararam no pomar. Lá encontraram o chefe dos Estorninhos que logo lhes fez sinal.
-Missão cumprida! - Exclamou o Capitão Cotovia - Como está a Princesa?
-Doem-me um pouco as asas, mas dentro de dias já devo ser capaz de voar. Tenho é muita fome.
Mas ao acabar esta frase a princesa viu que o seu amigo pardal lhe trazia uma maçã vermelhinha. Comeram e riram-se e agradeceram ao Esquadrão tê-los salvo,
Nos dias seguintes o Pedro foi visitar sempre a Ana e levava-lhe maçãs para que melhorasse. As asas dela depressa recuperaram mas a amizade entre os dois pequenos passarinhos ainda hoje dura, e partilham muitas vezes maçãs por todos os Pomares.

domingo, abril 13, 2008

!

Escrever assim a quente nunca foi o meu forte. É dificil perceber o que escrevo quando as lágrimas me correm os olhos. Quero ser uno e não quero que me corra o sangue esta tristeza desmedida. Quero ver, ser, respirar melhor. É me dificil respirar com tudo o que me puseste no peito. Encheste o meu para esvaziar o teu.
Ninguém quer ouvir. O mundo está surdo. Está surdo de tanto barulho. De tanta notícia. Novas. As vidas. Surdas surdas. Porque ouvir-me na minha própria cabeça é melhor que me ouvir da tua boca. Todo o mundo surdo. Por isso escrevemos na esperança que ainda não esteja cego.
Quero comer porque foi uma idiotice vir para aqui com esta fome. Quero que ela me saia da cabeça e tu também. E as lágrimas da cara e o mundo de ti. Sou demasiada dor e demasiado negro para que saia algo que não turvo dos meu dedos. O mundo esse está surdo. Ninguém ouve senão a sua voz etérea a dizer o que pensa. Tudo o que pensa. Estou tonto. Serei um louco por querer felicidade. Serei tão pouco que o mundo me vire assim as costas. Está surdo. Quando é que deixaste de me saber?
Já me perdi. Já não me encontro. E tudo pelo que me perco é agora pisado por ti. Uma dor proeminente na cabeça. Tonto tonto. Vivo conformado ao mundo. Medo de magoar, medo de agitar o mar.Toda a gente que é desprezo. Nunca vos dezprezei e é com o meu cuidado que me espezinham. Sois altos de mais. O vosso cheiro é tão mau quanto o espirito. Eu sou uno, sou íntegro. Já os vossos cus não podem dizer o mesmo. Porque passam a vida a meter nele tudo o que vos dá jeito . A merda que o mundo é começa nos olhos que o veem. Que se lixe o mundo surdo que já não quer ouvir ninguém.
Os julgamentos participados maravilhosamente na mente. De merda! E as alegações de acusação brilhantemente expostas. E as de defesa?
Não me defendo já. Choro. Copiosamente. Porque o mundo surdo prefere ver-se a sorrir. Porque ninguém ouve o que não quer ser. E é tudo uma merda.

Transfigurações: Sono

Do chão floresce um algodão redondo e fofinho. No céu voam pardais branquinhos em bandos triangulares. Há uma montanha de almofadas do tamanho de uma casa. A brisa sopra docemente fazendo zumbir os ouvidos ao de leve. Deitado em cima das almofadas os meus olhos são puxados violentamente para a terra. O corpo todo mole em dormencia, os olhos parecem até trocar-se com a vontade de sonhar. O rosa e o azul bebé parecem beijar-se num são tão calmo que nem alberga o sol. Parecem cair do tecto flocos de neve quente que vão afagando a pele acalmando-a. Umas bailarinas silenciosas vão rodando sobre as pontas das sabrinas cor-de-rosa que combinam com a saia em tule da mesma cor. Há um som leve de xilofone que amacia o tempo. Os olhos a quererem fechar. Embriagado parece. Os olhos a ficarem escuros. Toda a cor branda a abrandar. Já nem ouço o xilofone. Já não vejo nada. Só o calor quentinho. Já não peso nada. Um calor quentinho. Não ouço nada. Calor Quentinho. Já não... quentinho.

terça-feira, abril 08, 2008

(Sem Assunto)‏

O negro vem comer-me o coração, as lágrimas estancaram-se lá atrás, mas a dor fica aqui como sempre. É facil falar para despejar a dor de nós, o dificil é falar sem a dor nos toldar a voz. Há dias em que morro. Hoje morro.

sexta-feira, abril 04, 2008

Robot

Os dedos redondos metálicos, o tronco e as pernas em rectas perpendiculares ao chão. Caminho em tons de cinza e o mundo aparece-me em grelhas verdes. Os sensores falam-me do perigo. O perigo não o sinto. Não sinto. Ajo, executo, não penso. Não vivo. Vivo. O metal arranha-me os movimentos, o vidro acompanha-me o olhar. Suspender, hibernar, desligar. Não durmo. Reparar. Reparo em tudo e em todos. Não reparo em mim. Eu não existo. Não sou lata mas conservo-me artificialmente entre suplementos e sintéticos. Durmo. Acordo. Nunca. Suspendo, reinicio. Eu não existo. Faço-me existir por aquilo que faço. Faço existir. A ti aos outros. Tu existes porque eu te faço existir. Mas como posso eu existir. Quem me faz? Made in China. Made in Paraíso. Since Adão. Caminho em cinzento. Verde verde o olhar. Grelhas de vida, grelhas para a vida. Tudo segundo plano. Nunca existir. Executar, cumprir, seguir, nunca fazer. Não penso. Não olho, meço, avalio e registo. Não ouço, gravo e edito. Não cheiro, recolho e analiso. Não saboreio, testo e indico. Não sinto, nada. Não existo, só faço existir.

Aprimorar

Hoje o dia é de primavera. Cheira intensamente a ti naquela tarde de primavera. Quando no jardim verde de inveja, enquanto as arvores floresciam eu te beijava a frente com o sol a beijar-me as costas. Traizas uma saia azul que fazia lembrar o tempo e uma camisa branca que me fazia olvidar tudo. Cheirava a ti e a flores. Cheirava tudo a felicidade. Hoje cheira a primavera. Não quero que cheire a feliz porque isso é para outro dia. Um que tu te vistas do tempo e eu me pendure na tua mão. Tempo tinto de ternura da primavera. Os passarinhos não se beijam mas namoram, bem perto do meu olhar. As flores abrem-se e vestem-se das cores que habitam o meu peito. O vento gentil sopra sobre as folhas na puberdade e eu lembro-me do teu cabelo a ondular. O sorriso corre o dia. Tu corres-me o sangue, o sangue corre-se de alegria. Espera o dia. Vive a alegria.