Conto-lhe o Natal
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Havia estrelas transparentes contra o céu que aquecia levemente as calças pretas de bombazine. Ela como um anjo vestia uma saia que terminava numas botas que lançavam pelinho. Com um olho mais aberto que o outro por causa do sol ele observava tudo isto.
-Se fosse só um raminho não te custava nada. - lançou ela por entre o silêncio perdido na confusão de sons.
Ele baixou rapidamente os olhos mas o coração queimou o ar todo que serviria uma resposta.Os pés dançavam-lhe nervosamente contra a neve de pedra da calçada. Ela olhava para ele e para o seu azevinho. Alternadamente. O vermelho do azevinho parecia reflectir-se na pequena bochecha dele e contrastava com o frio que ela sentia nas mãos demasiado brancas. Tinha-as cerradas como se isso tornasse a sua vontade mais forte e ele lhe desse um bocado de azevinho. -A minha avó esta doente sabes? E eu passo o Natal com ela. Com ela e com os meus pais. Com quem passas tu o Natal?-a face dele escondia-se em vergonha- Deves passar com a tua mãe. Nós somos poucos mas o Natal é fixe assim. Gostas do Natal?- perguntou ela novamente sem resposta verbal mas com uma enorme velocidade das calças de bombazine.
Normalmente ele já teria levado uma canelada e um valente puxão no azevinho seguido de uma corrida de pés pequenos mas frenéticos, mas as bochechas de azevinho eram completadas por umas belissimas folhas verdes nos olhos que faziam derreter o pequeno coração de Sara.
-Olha lá ó cara de azevinho, como é que te chamas mesmo?-atirou ela num pedido em desafio que o coração pedia.
-Eu chamo-me David.... Da-David Félix. - respondeu ele de forma completa após o virar de cara dela fingindo desinteresse.
-Olá David, dás-me um bocadinho do teu azevinho?- o tom mandão parecia ter desvanecido um pouco e as mãos há pouco enroladas em si próprias enrolavam agora o cabelo que não se deixava enrolar estendendo-se até aos ombros.
Desta vez a resposta dele surgiu num lento abanar de cabeça fazendo esvoaçar de novo um não.
-Fogo, porquê?-perguntou ela deixando que toda a impertinência voltasse à sua voz.
Ele, sem nunca tirar os olhos do chão e com o azevinho a queimar-lhe as faces, respondeu num sussurro praticamente inaudivel por entre os pregões a 5 euros:
-Porque se te der tu vais embora e eu fico aqui sozinho outra vez.
Sem pensar muito bem na resposta e a uma velocidade de estrela cadente ela rispostou com um sorriso nos olhos:
-E não!
E então ele olhou-a pela primeira vez desde a sua formal apresentação e pela primeira vez sentiu o peito manchado de vermelho e dourado largando todo um Natal num sorriso de olhos entreabertos e com o sol a iluminar-lhe a felicidade.(continua no Natal!)