quinta-feira, abril 19, 2007

M no céu

Hoje apetece-me escrever no céu. Sem ter que me prender a textos e canetas. Escrever só. Encher de metáforas molhadas um vidro baço. Dar azo a mil versos luminosos numa lampada longa. Espalhar assim a minha palavra por tudo e tudo. Uma palavra só. Uma palavra onde coubesse o mundo. Mas mundo não explica o mundo todo. Uma que explicasse. Uma frase, pelo menos. Uma frase que enchesse o céu, ficasse reflectida no mar e inundasse os olhos do universo. Uma frase que fosse minha, e tua, e do mundo, e só de alguém e de toda a gente. Uma frase só. Uma frase de amor, como "Se o amor for azul, quero ser o teu mar" ou sobre a morte: "Por mais que a saudade me lave os olhos é o teu nome que melhor se lê no meu olhar". Mas estas falam para alguem. Tinha de ser uma frase que falasse ao mundo. Sem discurso directo. Mas tudo me parece tão rente ao chão. Tão pouco celestial. E eu queria era escrever no céu. Uma letra que fosse. Um M.

quinta-feira, abril 12, 2007

Cola

É um pouco estranho falar da cola nesta ultima história. Acho que todos vemos a cola como algo impuro e um pouco nojento. Ninguém gosta de ter os dedos a colar ou que os pés se colem ao chão. Mas este amor de cola não é nada disso. Talvez um pouco.
As circunstâncias em que se conheceram eram tão diferentes de hoje. Como a cola no fundo, tem aquele aspecto liquido e pastoso, mas passado algum tempo é dura e vitrea. Pois bem. Comecemos por ai. Kabisa era uma criança a bem dizer. Tinha passado a senhora à pouco tempo mas não se sentia como tal. Era ainda uma criança que já vestia saia de senhora. E foi ao conhecer Montsho pela primeira vez que se sentiu mulher. Ele fazia senti-la assim. Porque ele era homem, era homem e queria-a. Ela sentia-se pequenina à beira dele, mas era um pequena maior. Então começaram a colar-se. Ele porque se sentia admirado, ela porque se sentia bem a admirar.
Isto foi o liquido e pastoso. Hoje tudo é oposto. Kabisa habituou-se à presença de Montsho e deixou que ele se cola-se a si. Hoje mesmo que quisessa estava demasiado colada a ele. Ele admira-se com ela, ele idolatra-a como em tempos ela o idolatrou. Ela gosta desse idolatro. E colam-se assim no amor sem precisarem de pensar na cola que os une e como ela mudou ao longo do tempo. Talvez nenhum dele repare que se colaram sem pensarem e que mantem a cola sem saberem. Mas ainda que pensem nisso constantemente a cola que os une é demasiado forte para se descolarem.